F L O W.



FLOW. A deriva 


País: Letônia, França e Bélgica. 

Direção: Gints Zilbalodis

Ano : 2025

Melhor animação: Globo de Ouro e European Film Awards,  Associação dos Criticis de Cinema de Lós Angeles, Circuito de Críticos de Cinema de New York




N




     Desenho animado de animais e onde o protagonista é um gatinho de olhos laranja.  Não há fala, apenas sons característicos desses animais. mas através das expressões faciais podemos entender os pensamentos dos personagens.  Não há humanos no filme apesar de podermos perceber nos comportamentos desses personagens atitudes humanas. 

    O gatinho está só e encontra uma matilha e acaba por ser perseguido por causa de um peixe. Um dos cães simpatiza com o gatinho e sai da matilha pra se unir a ele. Ele percebe que o gatinho não entende que está pra ocorrer uma catástrofe, um dilúvio, que inundará  tudo.  Mas o gatinho de personalidade desconfiada e independente se recusa a seguir o cão amigo e acaba por ter de nadar até  encontrar um barco que tem dentro uma capivara. Esta é muito tranquila e amistosa.  Seguindo o rumo da correnteza, a capivara vê um lémure colecionando objetos brilhantes e rouba o cesto com seus pertences, pra obrigá-lo a entrar no barco. Pois este iria se afogar se ali permanecesse. . A maré abaixa e a terra surge.  O gatinho cai na água fascinado pelos peixes e pela fome. Desmaia e acorda nas costas de um peixe estranho, muito grande, como uma baleia que o salva. Uma garça o pega e traz à terra dando-lhe um peixe .Assim, provocando  a ira de outras garças. Isso acabou em uma briga com toda a sua família, acabando até ferida, na asa. Esta também  se une ao grupo do barco. Ela é imponente e seu temperamento é orgulhoso e mau-humorado.  Toda soberba a garça é o capitão e se posiciona no leme. Ela tem o controle.  O gatinho sonha, e é um pesadelo, muito semelhante com o que está vivendo. Nesse sonho ele está cercado por uma manada de alces que correm em círculos à sua volta O nosso fofo gatinho com seu olhar expressivo e seu jeito vulnerável percebe após o pesadelo que precisa enfrentar o desafio da pesca nesse oceano sem fim. Precisa mergulhar e pescar para ajudar também seus a amigos famintos. Ele é sem , dúvida, o mais ágil e melhor para esse feito. Com coragem, confiando na experiência boa com a “ baleia” , executa a empreitada. E, assim, alimenta a todos com muitos peixes. Reencontram a matilha perdida do cão , a anta maternal consegue a posse do leme para ir de encontro a eles. Eles no barco se comportam como vandalos e quebram o espelho do Lêmure e comem tudo, enfim, são colocados pra fora. A família dos Lêmures assim com as famílias dos outros companheiros, se comportam sem nenhum respeito pelos demais.  Roubam, invadem! 

      Enfim todos os personagens destoam de seus semelhantes em raça ou espécie e demonstram empatia e respeito  pelos companheiros do barco., Todos se afastaram de suas famílias por não se sentirem respeitados ou valorizados.  Esses quatro animais  percebem a dificuldade da sobrevivência na circunstância catastrófica que estão passando. Passam a contar e confiar uns nos outros e desenvolvem com base nessa confiança uma verdadeira união e amizade.  A adoção mútua desse grupo  tão diferente ,mesmo com os aborrecimentos eventuais, fica cada vez mais evidente na história. A empatia e identificação assim como nos humanos, ultrapassa nacionalidade, idade, ou qualquer outra semelhança. São os valores éticos, a afetividade , a sensibilidade e até a inteligência que ditam a paridade ou afinidade entre os seres. Especialmente entre os seres humanos.

    Importante também a ideia que o filme traz sobre o fruir da vida. Me fez lembrar do provérbio popular: “ Quer fazer um deus rir? Conte seus planos a ele. “ Pensamos que estamos no controle de nossas vidas, que nossos planos e nossos desejos e até pensamentos são o leme de nossas vidas. Estamos vivendo um momento histórico no qual precisamos acreditar que se pensarmos que tudo vai dar certo, tudo dará certo. Que se cogitamos os problemas que poderão surgir , estamos nos sabotando. O que se estipulou como  negativo  e o positivo se tornou parâmetro de controle dos acontecimentos da vida. 

 Sendo que positivo é o que quero e o que penso que vai acontecer e negativo as angústias e medos naturais  que todos temos dos imprevistos. A angústia para Freud é um sinal de alerta para podermos nos prevenir e nos preservar. O medo igualmente em doses normativas é também preservação. Então parece que o pensamento dito positivo atua como uma superstição,  que vai evitar que o pior aconteça.Ou, seja, o nosso pensamento, que está dentro de nós, de acordo com nossa vontade , determina nossa vida. Somos praticamente nossos próprios deuses. O Universo segue nossos pensamentos. Podemos comandar a vontade de Deus. E a vida  é algo a ser domesticada à força do pensamento. A vida e os sentimentos ditos negativos, como a dor psíquica, a tristeza.  Embora a psicanálise já tenha dito, desde o século passado, que o luto não vivido na época de sua ocorrência é o que poderá promover, mais tardiamente, a  depressão.  Vimos isso no  trabalho premiado  de Freud,” Luto e Melancolia”.

    Me recorda muito a reação infantil que quando acontece alguma coisa que disturba a criança ela põe a mão nos olhos e assim, tudo de ruim não está mais lá. Ela se esconde assim também: se ela não vê , ninguém a pode ver ,tampouco!

    A roda da vida é viva! Assim como canta Chico Buarque, “ a gente quer ter voz ativa e no nosso destino mandar mas eis que chega  a roda viva e carrega ….”

    0s Dilúvios podem acontecer muitas vezes na vida e nos coloca os desafios de superação com novas aprendizagens que certamente, não estavam em nossos planos. A vida nos puxa pois somos vulneráveis e indefesos como o gatinho. Muitas vezes inocentes. Aliás também somos uma espécie animal É difícil é passar por tantas provas que a vida nos coloca sem perder a sensibilidade, a empatia e a vontade de ajudar. Esse grupo nos mostra que passar em companhia é sempre mais fácil quando estamos empenhados no nosso desenvolvimento afetivo e espiritual. E isso inclui o luto, perder pessoas que amamos. A cena do gatinho seguindo a garça ferida no corpo e na alma, e que está prestes a desaparecer nos céus, mostra a profundidade da dor da perda. 

    Mas o que me transbordou foi me recordar da simplicidade da vida com esses queridos bichinhos,  que me trouxeram para o essencial!  

    Como animais temos escolhido em nossa civilização talvez , o pior lado, o lado da competição para  estarmos sempre no topo da cadeia alimentar , especialmente entre nossa própria  espécie. Interessante ver no filme, esses animais , classificados como inferiores , conseguindo conviver entre eles com respeito ,csem discriminações, competições ou preconceitos. Daí, que apesar de apocalíptico, o filme traz a esperança de uma Era melhor, onde existe confiança, colaboração  e fé na vida.  Concluindo com um sol ao final! 

   A cena final nos remete ao fato que um novo dilúvio aconteceu ,com toda aquela água.

   Pois, o certo é que estamos todos nós , da terra , à deriva,  fruindo com a correnteza.   

      O fato de ter sido feito no formato de desenho de animais ficou atraente tanto para adultos quanto para crianças.  Nesse aspecto é um filme extremamente democrático. Nesse barco cabemos todos!

.  Oscar muito merecido!









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